terça-feira, fevereiro 13, 2007

mini-bestiário para crianças cínicas e/ou sádicas (versinhos infantis ecológicos)



O patinho
O patinho nasceu defeituoso,
biquinho não abria,
peninha não nascia,
patinha não mexia.

A mãe-pata, essa urrava de raiva:
‘Que inglória parir uma ave da escória!’

Do patinho, ninguém se afeiçoava.
E o pior: uma galinha sempre o caçoava:
‘Pato do cão, como pode ser tão feio,
miserável sujeito!
Te olho na cara e tua feiúra me cala.
Vai pro teu canto e te mata,
infelizinho de patas!’

O feioso não se rogava,
estufava o peito e dizia:
‘És uma ave estúpida,
ó galinha calhorda.
Olhe-se no espelho
e veja a besteira que és:
bicha demente, atrofiada nas asas
cloaca doente a expelir ovos
de onde não nascem pintos,
só matam a fome dos povos
em nada confiáveis, em nada distintos
que te comem grelhadas
porque não se suportam nas ancas avantajadas,
gordas e mal-amadas.’

A galinha, então, ficou profundamente magoada:
‘Sou burra sim,
mas sou tão inglória
quanto a tua mãe,
patinho da língua afiada
e do coração duro.’

No que pato retrucou:
‘Até aí levo vantagem entre os seus,
galinha coroca.
Nunca ouvi dizer
de coração de pato enfiado no espeto.
Já de galinha...
nem dez, nem vinte, nem cem
das suas irmãs mortas e mutiladas
matam a fome daqueles homens horrorosos
humanos de patas.’


O Rinoceronte
Do alto da ponte
Pulou o rinoceronte
O rio era fundo
Agora ficou raso
Tudo em volta inundou
A terra molhou
E sujou o vaso

O rinoceronte nada sofreu
Só um pouco d’água bebeu
Os demais animais adoraram a cena
“Bis, bis”, gargalhava a hiena

Quem não gostou do ocorrido
Foi o pitu que não foi socorrido
A tempo de evitar o mal maior
Mal maior?
Mas que mal maior?
De ser confundido
Com uma lagosta ao thermidor

A vaca
A vaca é um bicho gordo,
Tetudo e rabudo
Se espelho tivesse a leiteira
Saberia por que, além de tudo,
Continuava solteira

Que boi vai querer tal trubufu?
Fêmea peluda não tem vez
Mesmo que macia seja a sua tez
Nem touro, nem nada que tenha peru
Vai se engraçar com tamanha insensatez

À pobre vaca só resta uma saída digna
Ir ao abatedouro por livre vontade
Já que não há quem a coma em provecta idade
Terá uma morte lenta, horrorosa e maligna.

O porco
Quando a gente morre
A gente fica fedido
Não é diferente
Com o porquinho querido

Não que em vida
Ele já não cheirasse mal
Mas é tão simpático o diabo
Que ninguém liga
Pro desconforto nasal

Um dia tentou passar perfume
E o soneto ficou pior que a emenda
O gambá, morrendo de ciúme,
Ligou para a França
Com a seguinte encomenda:

“Tragam-me colônias e extratos!
Se o porco pode se livrar do budum
Nós também seremos perfumados
Nisso não vejo problema algum!”

A Lagartixa
Ela vive trepada na parede
Só os tolos dela têm medo
Povo que tem joanete
E um humor pra lá de azedo

A lagartixa é nossa amiga
Come pernilongo com sua linguona
Não adianta matá-la com pesticida
Só vai fazer mal pra essa gente bundona

Aqui vai um apelo de militância
Deixem as lagartixas em paz!
Elas estão fartas de tanta ignorância
Enquanto você tá mais pra pagode
Elas são ladies em clube de jazz

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